Durante um sono de qualidade, o organismo é capaz de reparar tecidos, consolidar memórias e reduzir sinais de inflamação que acumulamos ao longo do dia. O descanso adequado também influencia diretamente a liberação dos hormônios que controlam o apetite, afetando a forma como o corpo lida com a fome e a saciedade.
Quando o sono é insuficiente ou de má qualidade, ele causa um desequilíbrio nesses mensageiros químicos, desregulando o controle alimentar e aumentando o risco de ganho de peso.
Conversamos com a cardiologista Juliana Soares para entender como funciona o mecanismo e de que forma o sono interfere na sensação de fome, no armazenamento de gordura e no risco de desenvolver doenças metabólicas.
Qual a relação entre o sono e o controle da fome?
Durante o sono, o organismo passa por um dos períodos mais importantes de regulação metabólica, e um dos processos diretamente influenciados por ele é o controle da fome. A privação de sono interfere nos mecanismos responsáveis por equilibrar saciedade e apetite, alterando a forma como o corpo interpreta suas necessidades energéticas, segundo Juliana.
Quando dormimos, o cérebro ajusta hormônios e neurotransmissores para indicar que o corpo precisa de menos energia durante o descanso e de mais energia ao despertar.
Mas, quando o sono é curto ou de má qualidade, o cérebro entra em estado de alerta, interpreta o cansaço como falta de energia e estimula maior ingestão de alimentos para compensar o desequilíbrio.
De acordo com a cardiologista, o córtex pré-frontal, responsável por decisões racionais e controle dos impulsos, fica menos ativo, reduzindo nossa capacidade de avaliar escolhas alimentares com clareza. Ao mesmo tempo, a amígdala, região ligada às emoções e ao sistema de recompensa, torna-se mais ativa, ampliando a busca por estímulos prazerosos.
Com o cérebro cansado e precisando de energia rápida, cresce a preferência por alimentos que fornecem combustível imediato, como carboidratos simples, açúcar e gordura.
Quais os hormônios responsáveis por regular o apetite?
O controle do apetite depende de dois hormônios principais, e o sono interfere diretamente no funcionamento de cada um deles:
- Grelina: produzida no estômago, é responsável por sinalizar fome. Quando o sono é pouco, os níveis de grelina aumentam, provocando sensação de fome mais intensa e mais frequente;
- Leptina: conhecida como o hormônio da saciedade, é produzida pelas células de gordura e informa ao cérebro quando já ingerimos energia suficiente. Com sono insuficiente, os níveis de leptina diminuem, fazendo o cérebro interpretar que ainda falta energia, mesmo após a alimentação.
Em conjunto, os desequilíbrios fazem a falta de sono aumentar o hormônio da fome e diminuir o da saciedade, levando a pessoa a comer mais e sentir menos satisfação depois das refeições.
Sono de má qualidade pode afetar o peso e a saúde do coração
Com a desregulação dos hormônios que controlam fome e saciedade, aumenta a ingestão de alimentos, principalmente carboidratos e doces — o que favorece o ganho de peso. A obesidade, por sua vez, eleva a sobrecarga do coração e aumenta o risco de problemas cardiovasculares.
O sono também é o momento em que a pressão arterial e os batimentos cardíacos diminuem de forma natural. Quando não dormimos bem, o corpo continua em alerta e aciona o sistema nervoso simpático, ligado à resposta de luta e fuga. Isso faz o cortisol subir, aumenta a pressão, acelera o coração e deixa a inflamação mais intensa.
Com o tempo, ocorre um desgaste do sistema cardiovascular, aumenta o risco de hipertensão e diminui a capacidade de recuperação do organismo durante a noite.
Qual a quantidade ideal de sono?
A quantidade ideal de sono varia conforme a idade, porque cada fase da vida tem necessidades diferentes. Mas, no geral, Juliana aponta:
- Adolescentes: 8 a 10 horas por noite;
- Adultos jovens e adultos: 7 a 9 horas;
- Idosos: 7 a 8 horas.
Dormir menos de 6 horas de forma contínua aumenta o risco de hipertensão, diabetes, ganho de peso e doenças cardiovasculares. Por outro lado, dormir muito além do recomendado também pode indicar algum desequilíbrio no organismo, como depressão, apneia ou fadiga extrema.
O mais importante é manter uma rotina regular e sentir que o corpo acorda descansado, com energia e sem sonolência excessiva durante o dia.
Como melhorar a qualidade do sono?
Algumas medidas importantes ajudam a melhorar a qualidade do sono e a manter o equilíbrio hormonal ao longo do dia:
- Manter regularidade no horário de deitar e acordar, inclusive em fins de semana. A rotina ajusta o relógio biológico e facilita que o corpo reconheça o momento certo de relaxar e despertar;
- Praticar higiene do sono, evitando telas por pelo menos 2 horas antes de dormir. A luz azul de celulares, computadores e televisão interfere na produção de melatonina, hormônio que sinaliza ao corpo que está na hora de descansar;
- Dormir em ambiente escuro, silencioso e com temperatura adequada, criando condições que favorecem um sono profundo e contínuo. Algumas medidas podem ajudar, como cortinas blackout ou ventilação leve;
- Evitar substâncias estimulantes, como cafeína, no fim da tarde e à noite. O efeito estimulante pode permanecer por horas e atrasar o início do sono;
- Evitar refeições pesadas próximas ao horário de deitar; o ideal é que a última refeição seja feita cerca de 3 horas antes do sono, para que a digestão não atrapalhe o descanso.
Quando procurar ajuda médica?
A procura por ajuda médica é importante quando a dificuldade para dormir começa a interferir na rotina, na saúde física ou no bem-estar emocional. Por isso, fique de olho nos seguintes sinais:
- Existe dificuldade frequente para iniciar ou manter o sono, mesmo com hábitos adequados;
- O cansaço persiste durante o dia, com sonolência excessiva, dificuldade de concentração ou lapsos de memória;
- Há roncos intensos, pausas na respiração durante a noite ou sensação de sufocamento ao acordar;
- O sono é fragmentado, acompanhado de despertares constantes ou sensação de sono “não reparador”;
- Irritabilidade, ansiedade ou alterações de humor relacionadas ao cansaço contínuo;
- O uso de cafeína ou estimulantes aumenta porque a pessoa não consegue manter energia ao longo do dia;
- Existe ganho de peso associado ao sono ruim, com aumento do apetite e preferência por alimentos calóricos.
O acompanhamento médico permite identificar causas como apneia, distúrbios hormonais, depressão, ansiedade, uso de medicações ou hábitos que interferem no descanso. A avaliação adequada ajuda a recuperar a qualidade do sono, prevenir complicações e melhorar a saúde.
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Perguntas frequentes
1. O que caracteriza um sono de qualidade?
A qualidade do sono envolve profundidade, continuidade e descanso real ao despertar. Uma noite bem dormida permite que o organismo reduza a inflamação, reorganize hormônios, repare tecidos e estabilize funções vitais.
A pessoa adormece com facilidade, permanece dormindo por horas suficientes e acorda com sensação de energia, sem sonolência excessiva ao longo do dia. A regularidade também importa, porque o corpo precisa de ritmo para manter o equilíbrio biológico.
2. O que causa dificuldade para dormir?
A dificuldade para dormir pode surgir por fatores emocionais, como ansiedade, preocupação e estresse, ou por hábitos inadequados, como uso de telas até tarde, consumo de cafeína à noite, ambiente quente, ruído ou luz excessiva.
Casos de dor crônica, a apneia do sono e distúrbios hormonais também influenciam na qualidade do sono.
3. Dormir demais faz mal?
O excesso de sono pode indicar desequilíbrios, como depressão, apneia, anemia ou doenças metabólicas. A duração acima de 10 horas, quando repetida por longos períodos, costuma ser sinal de que o organismo está sobrecarregado ou lutando contra alguma condição médica. A investigação clínica é importante para identificar a causa.
4. O que é higiene do sono?
A higiene do sono reúne uma série de práticas que facilitam o descanso, como manter horários regulares, evitar telas à noite, reduzir luzes fortes, criar ambiente silencioso e fresco, e evitar refeições pesadas no período noturno. A adoção constante dos hábitos melhora a qualidade das horas dormidas e reduz os despertares ao longo da noite.
5. Por que a luz prejudica o sono?
A exposição à luz, especialmente à luz azul emitida por celulares, computadores e televisões, reduz a produção de melatonina, hormônio que prepara o corpo para dormir. A luz informa ao cérebro que ainda é dia, atrasando o horário natural do sono e dificultando o início do descanso.
6. Como criar um ambiente ideal para dormir?
O ambiente ideal inclui quarto escuro, silencioso e com temperatura amena. A organização do espaço, a escolha de colchão confortável, o uso de cortinas blackout e a retirada de estímulos visuais reduzem interrupções e favorecem sono profundo. A sensação de segurança e conforto também influencia a qualidade do descanso.
7. A prática de atividade física ajuda a dormir melhor?
A prática regular de atividade física melhora o humor, reduz o estresse, regula hormônios e aumenta a sensação de relaxamento ao final do dia. O movimento constante também ajuda a equilibrar o ciclo sono-vigília.
A orientação mais comum é evitar exercícios intensos próximo ao horário de dormir, porque o corpo leva um tempo para voltar ao estado de calma. Após o jantar, fazer caminhadas leves à noite podem favorecer a transição para o sono.
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